A oposição em crianças
- Renata Begosso

- 19 de jun.
- 3 min de leitura
Atualizado: 29 de jun.
Aprender a dizer “não” é uma importante aquisição na infância. Representa colocar limites, aprender o que gosta e o que não gosta, se manifestar.

Pensemos em exemplos: se seu filho está brincando na praça e um desconhecido se aproxima, ele precisa saber dizer “não” e se afastar.
Se seu filho é sempre indiferente, não questiona nada, esse pode ser um indicativo de sofrimento. É importante que ele consiga dizer coisas como “gosto mais dessa brincadeira do que daquela”, ou ainda “isso me deixa desconfortável”. São sinais positivos do desenvolvimento subjetivo.
Por que, então, a oposição é vista como algo ruim?
Para responder a essa pergunta, é importante pensar o que se espera das crianças hoje em dia, é impossível fazer esse raciocínio fora do contexto sociocultural. Em uma sociedade com pais sobrecarregados e grandes jornadas de trabalho, vemos normas sociais que esperam que o critério de normalidade sejam crianças obedientes e passivas, o que não condiz com a natureza infantil.
Na literatura médica, a quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM V) apresenta uma categoria chamada “Transtornos disruptivos, do controle de impulsos e da conduta”. Nela, estão classificados alguns transtornos muito associados a crianças em idade escolar, como o Transtorno Opositor Desafiador (TOD).
O Manual define os “Transtornos disruptivos, do controle de impulsos e da conduta” da seguinte forma: “condições que envolvem problemas de autocontrole de emoções e de comportamentos [...] esses problemas se manifestam em comportamentos que violam os direitos dos outros (p. ex., agressão, destruição de propriedade) e/ou colocam o indivíduo em conflito significativo com normas sociais ou figuras de autoridade”.
Olhando para essa definição, vemos que o Manual deixa de lado o sofrimento do sujeito e coloca em foco comportamentos desviantes, que supostamente violam direitos e normas sociais, desafiam leis e autoridades.
Minha proposta é que passemos a olhar para a questão com uma nova lente: o que será que aconteceu e está acontecendo com a criança para chegar a esse ponto?
Como é estar diante de uma “criança opositora”?

Certamente, um desafio.
O que assola muitos pais e educadores é a sensação de um impossível de lidar: a criança parece não reconhecer a autoridade e uma desordem toma conta.
Mas, será que é isso mesmo que acontece?
Quando falamos em oposição, estamos falando da posição de “um” frente ao “outro”, uma posição de comparação e contraste. Para poder negar uma afirmação, é preciso reconhecer que ela existe.
Ou seja, quando uma criança parece se opor a tudo ou negar a autoridade do adulto, na verdade, ela reconhece a existência da norma. O que acontece é que essa criança se encontra presa em uma forma de existir no mundo: negando tudo aquilo que lhe é oferecido.
Esse modo de funcionar é sinal de sofrimento profundo por parte da criança.
Não se trata de negar a existência de um problema. Pelo contrário, acredito que as crianças funcionando dessa maneira precisam de cuidados. Também não se trata de negar diagnósticos. Em muitos casos, a ausência deles faz com que a comunidade em volta da criança não se atente ao que ela traz como questão.
Trata-se de ter cautela com diagnósticos precoces que apontam para supostas condutas patológicas, como se tratasse de um desvio de caráter a ser corrigido. Quando, na verdade, estamos falando de pequenos sujeitos em sofrimento.
Diagnósticos não são sinônimos de destino. Com a ajuda da psicoterapia, é possível encontrar novas maneiras de se relacionar com o mundo.
Se você conhece alguma criança passando por isso, entre em contato.



